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Autor Tópico: Livros  (Lida 70846 vezes)

Automek

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Re: Livros
« Responder #400 em: 2019-07-16 09:19:42 »
O Antunes já tinha recomendado esse livro. Tenho-o aqui para ler estas férias. Já o folheei e parece muito bom.

vbm

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Re: Livros
« Responder #401 em: 2019-08-04 19:20:34 »


E deves saber que todos estes anjos têm tanto
prazer, quanto mais a sua vista se profunda
na verdade, em que todo o intelecto recebe
apaziguamento.

Daqui se pode ver como se funda,
ser bem-aventurado no acto de ver,
não no amor, que logo o segue;

e o grau de visão é dependente das
obras meritórias, as quais são um fruto
da graça divina e da boa vontade.

         Par., XXVIII, 106-114   

vbm

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Re: Livros
« Responder #402 em: 2019-08-05 12:15:55 »


Censura por ficar a escutar baixezas

«Eu estava com atenção a escutá-los, quando
Virgílio me disse. «Agora continua a ouvi-los
por pouco que não me zango contigo».

Quando vi que me falava irado,
voltei-me para ele tão envergonhado, que
guardo ainda viva a recordação na memória.

Como aquele que sente desejo que o
dano, que no sonho o fez sofrer,
não seja realidade mas sonho;

assim eu, não podendo por vergonha, falar, queria
desculpar-me com palavras, e de facto desculpa-
va-me, mas não acreditava que me justificasse.

Virgílio disse: «Uma vergonha menor
levaria maior defeito do que o teu,
por isso deixa de afligir-te.

Se outra vez acontecer que a sorte te faça
encontrar pessoas empenhadas em litígios como estes,
faz de conta que eu estou sempre a teu lado:

ouvir baixezas é próprio de um ânimo baixo».

                  Dante, Inf., Canto XXX, 130-148

vbm

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Re: Livros
« Responder #403 em: 2019-09-04 18:39:54 »


[  ]

Concluí, hoje.
Espantoso!

Uma bíblia do conhecimento actual.

Sempre distingui as pessoas cultas
entre as que tinham ou não
lido uma História Universal.

Tenho de acrescentar o critério
das que consciencializam
ou não o limiar

indeterminado

do fim ou do princípio
da actual ou de uma nova
humanidade...



« Última modificação: 2020-02-08 17:36:16 por vbm »

vbm

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Re: Livros
« Responder #404 em: 2019-09-05 06:19:58 »
Vi ontem a última magistral entrevista da série Imagine 2084 da RTP 3
do Prof José Pedro Serra à cineasta-documentarista Graça Castanheira!

Pedro Serra discorre filosoficamente sobre a ciência, a técnica e a realidade,
com a radicalidade do seu olhar interrogativo do irremediável
lugar do lado de cá do espelho

Na RTP3 todas as sextas-feiras deste verão.

 01 ARLINDO OLIVEIRA
 02 BETH SINGLER
 03 GONÇALO LOPES
 04 JOSÉ SANTOS-VICTOR
 05 ADRIAN CURRIE
 06 LEYLA ACAROGLU
 07 ADAM KAMPFF
 08 PHILIPPE RODRIGUEZ
 09 GRAÇA FONSECA
 10 PAUL MASON
 11 NICK DUNN
 12 JOSÉ PEDRO SERRA


«Doze convidados, em entrevistas individuais, gravadas ao vivo no Centro Cultural de Belém (CCB),
e a exibir na RTP3, a partir do dia 2 de agosto de 2019, arriscam abordagens a partir das suas áreas
de conhecimento – ciências computacionais, sociologia, neurociências, robótica, filosofia, economia,
ecologia, direito, urbanismo, arquitetura – equacionando contextos, hipóteses de futuro, modos
de ser e de estar para as próximas décadas.»

vbm

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Re: Livros
« Responder #405 em: 2019-12-16 15:13:18 »
«Certamente a arte de escrever é a mais miraculosa de todas as coisas que o homem imaginou. As Runas de Odin foram a primeira forma da obra de um herói;  os Livros, palavras  escritas, foram ainda mais miraculosas do que as Runas, última forma. No livro jaz a alma de todo o tempo passado, a articulada e perceptível voz do passado; enquanto o corpo do passado, a sua substância material, desapareceram completamente, como um sonho.

Frotas poderosas e armadas, portos e arsenais, cidades vastíssimas, com grandes torres e grandes engenhos, – tudo isso foi precioso e grandioso, mas que ficou de tudo isso? Agamémnon, os numerosos Agamémnon e Péricles, e a sua Grécia, tudo isso passou, de tudo isso ficaram alguns fragmentos, blocos fúnebres e mudos; mas nos livros da Grécia, aí, sim, a Grécia vive para todos os pensadores, literalmente vive, pode ser evocada e chamada à vida.

Nenhuma runa mágica é mais estranha do que um livro. Tudo o que a humanidade fez, pensou, ganhou ou foi; tudo isso dorme como em mágica preservação nas páginas dos livros. Eles são a riqueza predilecta dos homens!»

Thomas Carlyle, Os HeróisOn Heroes, Hero-worship, and The Heroic in History» 1 841),
Trad. de Álvaro Ribeiro, Guimarães Editores, Lisboa, 1956, p. 231


« Última modificação: 2019-12-16 23:29:23 por vbm »

vbm

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Re: Livros
« Responder #406 em: 2019-12-21 13:25:19 »


«Não obedecendo a qualquer lógica, nem princípio de equidade,
o sistema fiscal português é um completo caos. É alterado per-
manentemente, gera injustiças e aumenta as desigualdades
que devia combater. Sem coerência, já nem é um sistema,
mas apenas um mecanismo de extorsão de dinheiro ao povo.
As alterações são abruptas e permanentes. Todos os anos,
Cada novo Orçamento de Estado representa uma nova Lei
fiscal. Os cidadãos não conseguem prever o seu rendimento
no ano seguinte, as empresas não investem porque não do-
minam o quadro em que se movem. Esta imprevisibilidade
gera insegurança.»

Paulo de Morais, Janela do Futuro, # Portugal 2016,
Gradiva, Lisboa, 2015, pp. 21-22


vbm

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Re: Livros
« Responder #407 em: 2020-02-08 14:01:51 »


BRUXA, começa a ler, declamando com grande ênfase

             Deves entender!
             De um dez fazer,
             E os dois deixar;
             Os três quadrarás
             E rico serás.
             Os quatro perder!
             C'os cinco e os seis,
             Assim diz a bruxa,   
             Sete e oito conta,
             E 'stá a cousa pronta.
             E nove são um,
             E dez é nenhum.
             Da bruxaria é esta a tabuada.

FAUSTO. Em delírio febril discorre a velha.

MEFISTÓFELES.  Para chegar ao fim falta-lhe muito,
Sei que todo assim reza o livro inteiro!
Desperdicei com ele infindos dias,
Pois a contradição, quando perfeita,
Para sábios e tolos é mistério.
É velha e nova, meu amigo, a arte: -
Com um e três e três e um foi moda,
Em todo o tempo, ir espalhando o erro
Em lugar da verdade. Assim quieto
Se discorre e se ensina; quem quisera
Meter-se com tais parvos? Quase sempre,
Quando vê só palavras, acredita
O homem que um sentido elas encerram.

(Fausto, 2517-2543)


Parece o capitalismo bolsista! -:)

JohnyRobaz

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Re: Livros
« Responder #408 em: 2020-02-08 16:17:21 »


Censura por ficar a escutar baixezas

«Eu estava com atenção a escutá-los, quando
Virgílio me disse. «Agora continua a ouvi-los
por pouco que não me zango contigo».

Quando vi que me falava irado,
voltei-me para ele tão envergonhado, que
guardo ainda viva a recordação na memória.

Como aquele que sente desejo que o
dano, que no sonho o fez sofrer,
não seja realidade mas sonho;

assim eu, não podendo por vergonha, falar, queria
desculpar-me com palavras, e de facto desculpa-
va-me, mas não acreditava que me justificasse.

Virgílio disse: «Uma vergonha menor
levaria maior defeito do que o teu,
por isso deixa de afligir-te.

Se outra vez acontecer que a sorte te faça
encontrar pessoas empenhadas em litígios como estes,
faz de conta que eu estou sempre a teu lado:

ouvir baixezas é próprio de um ânimo baixo».

                  Dante, Inf., Canto XXX, 130-148

Acabei também há duas semanas de ler a Divina Comédia, é uma obra fundamental para se perceber a faísca cultural e anti-papal que provocou o final da Idade Média e o início do renascimento, e mais tarde a Reforma. É também interessante a importância que a mitologia grega e romana ainda tinham numa altura em que a Igreja era absolutista, e o respeito que ainda assim foi mantido em relação aos Grandes Poetas, dos quais o seu predilecto acompanhante de viagem até à entrega à sua amada Beatriz, o grande Virgílio, tem grande destaque como mentor do próprio Dante.
No entanto, esses versos não me parecem os da edição que li, do Vasco Graça Moura. Leste outra diferente, vbm?

vbm

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Re: Livros
« Responder #409 em: 2020-02-08 17:25:10 »
Sim, Robaz! Eu li a do Vasco Graça-Moura e depois
a do Prof. Marques Braga, editada pela Livraria Sá
da Costa. É possível que a do Graça-Moura se atenha
mais estritamente à literalidade do original, mas para
mim, gostei muito mais da do Marques Braga por ser
claramente mais inteligível. Fiquei maravilhado com
o poema, e o subtil câmbio da expressão e das palavras
nas transições do Inferno ao Purgatório e deste ao Paraíso!
Há muitos anos que tencionava ler Dante! Tal como me
aconteceu com outros literatos e filósofos, não é à primeira
que se mergulha em cada um desses universos de pensamento
e compreensão do mundo. Agora, estou de novo a tentar Goethe,
e ainda irei a Virgílio, Boccaccio e Ariosto. Homero, com a ajuda
do Frederico Lourenço foi um acontecimento mais conseguido
do que o alcançado, pela prosa, das edições da Sá da Costa!
« Última modificação: 2020-02-08 17:30:45 por vbm »

vbm

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Re: Livros
« Responder #410 em: 2020-02-08 17:29:44 »
Mas, Robaz, a Commedia lê-se e relê-se
e vale cotejar com a versão original em italiano.
Jorge Luís Borges tem uma confissão empolgante
da sua experiência de (re)leitura da Divina Comédia!

JohnyRobaz

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Re: Livros
« Responder #411 em: 2020-02-09 13:19:45 »
Mas, Robaz, a Commedia lê-se e relê-se
e vale cotejar com a versão original em italiano.
Jorge Luís Borges tem uma confissão empolgante
da sua experiência de (re)leitura da Divina Comédia!

Sim! Tenciono ler os Nove Ensaios Dantescos do Borges, agora que li a Comédia! Isso e os ensaios do TS Eliot!

Eu, apesar da dificuldade que admito ter tido a ler esta obra, pois não é propriamente um romance em prosa, gostei imenso da edição do Graça Moura, e dou imenso valor a ele ter conseguido manter a forma poética original, as rimas, etc, mesmo havendo algumas "aldrabices" inevitáveis como passagem de palavras para os versos seguintes para o conseguir fazer. Mas é de louvar. E ter ali ao lado a versão italiana também ajuda a compreender o sentido dos versos nessas "aldrabices".

Também li os 2 do Homero do Frederico Lourenço, que também gostei muito. A edição da Eneida do Virgílio da Bertrand, que li, é que já é em prosa adaptada, pois na altura não havia, e creio que ainda não há, versão traduzida em poema. mas gostei muito também, e é importante para se perceber a 100% muita coisa abordada pelo Dante na Comédia, tal como outras obras que não li, como as Metamorfoses do Ovídio, por exemplo.

Mas agora se voltar a ler a Comédia será um dia mais tarde,

vbm

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Re: Livros
« Responder #412 em: 2020-02-09 15:00:51 »
A Temas & Debates (1997) tem a Eneida de Virgílio em verso traduzida pelo Agostinho da Silva.

vbm

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Re: Livros
« Responder #413 em: 2020-02-09 15:07:17 »
Olha o que Jorge Luís Borges diz sobre a Commedia:

(Como ler a Divina Comédia)

Numa página estava o texto italiano e na outra o texto em inglês, vertido literalmente.
Imaginei este modus operandi: lia primeiro um versículo, um terceto, em prosa inglesa;
a seguir lia o mesmo versículo, o mesmo terceto, em italiano;
ia avançando assim até chegar ao fim do canto.
Então lia todo o canto em inglês e depois em italiano.

Nesta primeira leitura compreendi que as traduções não podem ser
um mero sucedâneo do texto original.

A tradução, de qualquer modo, pode ser um meio e um estímulo para
aproximar o leitor do original; (...)

Logo observei então que os versos,
sobretudo os grandes versos de Dante,
são muito mais do que aquilo que significam.

O verso, entre muitas outras coisas,
é uma entoação,
uma acentuação muitas vezes intraduzível.

Quando cheguei ao auge d’«O Paraíso»,
quando cheguei ao Paraíso deserto,
aí, nesse momento,
em que Dante é abandonado por Virgílio
e se encontra sozinho e o chama,
nesse momento senti
que podia ler directamente o texto italiano
e só olhar de vez em quando para o texto inglês.

Li assim os três volumes nessas lentas viagens de eléctrico.
Depois li outras edições.

Li muitas vezes a Comédia.
A verdade é que não sei italiano,
não sei outro italiano senão
o que me ensinou Dante ( )

Lia todas as edições que encontrava
e distraía-me com os diferentes comentários,
as diferentes interpretações dessa obra multifacetada.

Verifiquei que nas edições mais antigas
predomina o comentário teológico;
nas do século XIX o histórico,
e actualmente o estético,
que nos faz notar
a acentuação de cada verso,
uma das maiores virtudes de Dante.
(...)
Se escolhi a Comédia ( ) é porque sou um homem de letras
e creio que o ponto auge da literatura e das literaturas é a Comédia.
Isto não implica que coincida com a sua teologia
nem que esteja de acordo com as suas mitologias.
Temos a mitologia cristã e pagã baralhadas.
Não se trata disso. Trata-se que nenhum livro
me proporcionou emoções estéticas tão intensas.
E eu sou um leitor hedonista, repito-o;
procuro emoção nos livros.


(JL Borges, Sete noites, in Obras Completas, Vol. III, Círculo de Leitores, 1998), (pp. 214-5; 224)
« Última modificação: 2020-02-09 17:18:34 por vbm »

JohnyRobaz

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Re: Livros
« Responder #414 em: 2020-02-09 15:09:02 »
A Temas & Debates (1997) tem a Eneida de Virgílio em verso traduzida pelo Agostinho da Silva.

Fui enganado pelo livreiro então!

Fui pesquisar e há outra edição com mais obras traduzidas por ele do Virgílio, incluindo a Eneida:

https://www.wook.pt/livro/bucolicas-georgicas-eneida-virgilio/12964016

Talvez um dia decida reler em formato poético!

Automek

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Re: Livros
« Responder #415 em: 2020-02-09 16:20:42 »
Por falar em tradutores, que muitas vezes são ignorados, excepto em obras de grande relevo, recentemente li o Oliver Twist com tradução do Paulo Faria e é extraordinária. As palavras todas certas, no sitio certo, encaixadas de forma perfeita, a permitir uma fluidez de leitura extremamente agradável, num texto que, não sendo dificil, também não é de linguagem corrente.
Há traduções em que uma pessoa parece que está sempre a "engasgar-se" na leitura, apesar da tradução estar correcta do ponto de vista da simples tradução (o "by the book"). Como temos uma lingua extremamente rica em sinónimos, a tradução à letra, esquecendo o resto da frase, não tem comparação com uma tradução em que todo o texto, todo o sentido da frase, é considerado pelo tradutor para escolher o melhor sinónimo dentro dos disponíveis.
É uma maravilha quando se apanha uma pessoa competente neste aspecto (e provavelmente é coisa pouco valorizada pelos leitores e, consequentemente, pelos editores).
Paulo Faria. É um nome a fixar.

JohnyRobaz

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Re: Livros
« Responder #416 em: 2020-02-09 17:12:10 »
Por falar em tradutores, que muitas vezes são ignorados, excepto em obras de grande relevo, recentemente li o Oliver Twist com tradução do Paulo Faria e é extraordinária. As palavras todas certas, no sitio certo, encaixadas de forma perfeita, a permitir uma fluidez de leitura extremamente agradável, num texto que, não sendo dificil, também não é de linguagem corrente.
Há traduções em que uma pessoa parece que está sempre a "engasgar-se" na leitura, apesar da tradução estar correcta do ponto de vista da simples tradução (o "by the book"). Como temos uma lingua extremamente rica em sinónimos, a tradução à letra, esquecendo o resto da frase, não tem comparação com uma tradução em que todo o texto, todo o sentido da frase, é considerado pelo tradutor para escolher o melhor sinónimo dentro dos disponíveis.
É uma maravilha quando se apanha uma pessoa competente neste aspecto (e provavelmente é coisa pouco valorizada pelos leitores e, consequentemente, pelos editores).
Paulo Faria. É um nome a fixar.

Concordo, o tradutor é por vezes quase um segundo escritor.

Zenith

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Re: Livros
« Responder #417 em: 2020-02-09 19:14:53 »
J. L com o texto original. Borges que parecia ser uma biblioteca feita homem dizia que os tradutores podem tomar algumas liberdades, já que em cada idioma foi sendo construído com base em formas de sentir e compreender o mundo que nunca são totalmente coincidentes. Acredita que algumas vezes a tradução pode superar o original em que dá alguns exemplos

Citar
No soy de aquellos que misticamente prejuzgan que toda
traduccion es inferior al original. Muchas veces he com-
probado, o he podido sospechar, lo contrario. Los evi-
dentes calembours en que abunda el "Orticulo manual"
de Gracian (Milicia es la vida del hombre contra la mali-
cia del hombre: lo que este sigue, el otro persigue) lo hacen
muy inferior al Gracians Handorakel de Schopenhauer,
que, al prescindir de tales juegos, logra disimular el trivial
origen fonetico de las "ideas" que propone. Hacia 1827,
De Quincey tradujo al ingles el " Laocoonte" de Lessing;
he confrontado ambos trabajos; el texto ingles es mas ur-
bano y mas elocuente. Asi tambien, las prolijas versiones
literales de las 1001 noches (Lane, Burton, Mardrus, Litt-
mann) insintian e imponen la sospecha de que el resumen
de Galland es harto superior al texto arabe. No nos asom-
bren tales hechos; presuponer que toda recombinacion de
elementos es necesariamente inferior a un arreglo previo
es presuponer que el borrador 9 es necesariamente infe-
rior al borrador H ya que no puede haber sino borrado-
res. El concepto de texto definitivo no corresponde sino a
la superstition o al cansancio.

vbm

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Re: Livros
« Responder #418 em: 2020-02-15 17:09:25 »
Aqui vai, uma bela (en)cena(ção)
de teoria política monetária
-:)

IMPERADOR. Que propício destino aqui te trouxe
Dos encantos das Mil e Uma Noites?
Se tão fértil és qual Scherazade,
Estás do meu agrado bem seguro.
Acode pronto, quando o mundo de hoje,
Como sucede a miúdo, me aborreça!

MARECHAL (entra apressadamente.)
Sereníssimo, nunca em vida minha
Julguei novas trazer tão prazenteiras
Como as que ora de júbilo me inundam
E na tua presença me transportam!
Saldadas ‘stão s dívidas, té a última,
Desarmadas da usura as cruas garras,
Liberto eu de uma infernal angústia;
No empíreo não há mais alegria!


CONDESTÁVEL (logo após.)
Pago em dia o seu saldo têm
                           [as tropas,
Contratado outra vez está o exército,
Cada soldado sente sangue novo,
Taverneiros e moças o conhecem.


IMPERADOR. Como largo respira o peito vosso!
Do confrangido rosto as rugas fogem!
Apressados entrais!


TESOUREIRO-MOR (que ali se acha.)     
           Pergunta a este,   
Pois obra sua é tudo!


FAUSTO.                Expor o caso
Ao chanceler pertence.


CHANCELER (entra pausadamente.) O fim da vida
Ditoso dizer posso! – Ouvi, e vede
A fatídica folha que as misérias
Em riqueza abundante há transformado.

         (Lê:)

Saber fazemos nós a quem pertença
Que vale mil coroas esta nota.
Para penhor seguro, destinamos-lhe
Os tesouros no Império soterrados.
Mandado está que sirva ao pagamento
Esse valor em breve à luz trazido.»


IMPERADOR. Grande crime receio, burla imensa!
Quem contrafez ousado a firma augusta?
Atentado tamanho impune fica?


TESOUREIRO-MOR. Recorda-te! : Tu mesmo o assinaste
Esta noite passada! Eras vestido
De grande Pã! O chanceler connosco
Falou-te assim. «Da pena com dois traços,
Outorga o que será júbilo imenso
E salvação do povo!» A assinatura
Bem distinta firmaste, mil artistas
Logo a multiplicaram. Por que chegue
A todos o proveito, em continente,
Toda a série estampámos: temos prontas
Notas de dez, de trinta, de cinquenta,
De cem. Quanto lucrou com isso o povo
Nem tu sabes! Olha a cidade, há pouco
Como em sono de morte sepultada:
Revive tudo, goza, alegre folga!
O teu nome, que há muito o mundo preza,
Jamais com tanto amor fora saudado.
O alfabeto agora é já supérfluo:
Com esta firma só, tudo é ditoso.


IMPERADOR. E para o meu bom povo, isto val ouro?
Serve à corte, ao exército de paga?
Devo, embora me espante tolerá-lo.


MARECHAL. Impossível seria os fugitivos
Novamente colher, que se espalharam
Como o raio veloz, por toda a parte.
Abertas sem cessar, casas de câmbio
A ouro ou prata trocam cada nota,
Com desconto. Dali corre-se aos talhos,
Aos padeiros, às tendas: meio mundo
Só parece pensar em lautas mesas,
Em adornos custosos o outro meio.
Aqui vendem-se telas, além cortam-se;
«Viva o Imperador!» soa nas ruas;
Nas tavernas rescendem os assados;
Dos pratos ao tinir, saltam as rolhas.


MEFISTÓFELES. Quem sozinho passeia nos terraços,
Muita beldade vê, trajando galas,
De penas de pavão nos ricos leques
Meio rosto ocultando. Com sorrisos
Olham as notas mágicas. Mais pronto
Que com voz eloquente ou vivo engenho,
O supremo prazer de amor se alcança.
Ninguém com bolsas de ouro se incomoda:
Uma nota no seio entra tão fácil,
C’uma carta de amor tão bem se junta...
O padre no breviário as traz devoto;
Para marchar mais rápido, o soldado
Da pesada cintura os rins liberta.
Perdoe a Majestade, se pareço
Destarte rebaixar tão grande assunto!


FAUSTO. O cabedal imenso que sem giro
No solo de teus reinos se acoberta
Inútil jaz. A mente mais ousada
Tão colossal riqueza a custo abrange;
No seu voo mais altivo a fantasia
Fatiga-se e não chega a concebê-la;
Espíritos porém, no ver profundos,
Confiança infinita depositam
No que não tem limites.


MEFISTÓFELES.   Em vez de ouro,
De pérolas em vez, um papel destes
É tão cómodo!: Vejo num momento
Quanto possuo; de trocas nem contratos
Para isso careço, amor e vinho
Gozo a meu belprazer. Metal desejas?
O cambista está pronto, e, se não basta,
Escava pouco tempo: grilhões, taças
Em hasta são vendidos; prontamente
Se amortiza o papel e é castigado
Do insolente cétptico o escárnio.
Ninguém quer outra coisa, costumaram-se.
De ora àvante nas terras do Império
Ouro, jóias, papel temos a rodo.


IMPERADOR. Tão grande bem vos devem meus Estados;
Seja a paga ao serviço acomodada:
Entrego-vos do solo as profundezas,
Dos tesouros sereis dignos custodes.
Conheceis o jazigo recatado
E vasto. Quem quiser fazer pesquisas,
Tenha licença vossa. Tesoureiros,
Reuni-vos, de vosso novo cargo
Alegres revesti as dignidades,
Fundindo em harmonia proveitosa
O mundo subterrâneo c’o superno


TESOUREIRO-MOR. Dissenções entre nós jamais, que muito
Ganho em ter por colega o feiticeiro!

   (Sai com Fausto.)

J. W. Goethe, Fausto, Trad. de Agostinho de Ornelas (1867),
Reimpressão da nova edição ao cuidado de Paulo Quintela,
Atlântida, Coimbra, 1958, vv 5952-6065
« Última modificação: 2020-02-15 20:05:51 por vbm »

vbm

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Re: Livros
« Responder #419 em: 2020-02-18 15:24:48 »


«É a mulher mitológica um ser único:
 Como lhe apraz, o poeta no-la mostra;
 [ ]
 A essa forma única, essa essência
 Imortal que com Deus rivaliza;
 Tão grande como meiga; tão sublime
 Como terna e amável? Tu a viste
 Outrora; eu vi-a hoje, tão formosa
 Como cheia de encantos, tão formosa
 Quão loucamente fora desejada!
 O meu ser, minha mente estão cativos:
 Já, sem a conseguir, viver não posso!»

                                   [ ] estás apaixonado
 Entre humanos, porém entre os espíritos
 É loucura o que sentes. [ ]

                                         [ ]prece ardente
 Dirige sem cessar a [Esculápio]
                                  [ ] em breve espaço
 Co'a virtude dos símplices te sara.
 [ ]
 Potente é o meu pensar, não quero cura.
 [ ]
                                       Aquele eu amo
 Que o impossível quer.»

-:)

Goethe, Fausto, vv 7398-99;
 7410-21; 7424-25; 7430-33; 7459-60