Caso prático - Cálculo do EV/EBITDA da Pararede
Neste artigo vamos calcular um EV/EBITDA previsto para a Pararede.
Índice
Determinar o Enterprise Value (EV)
Para calcular o EV/EBITDA vamos obviamente ter que determinar o EV. Tal como abordado no artigo Enterprise value - Quanto vale um negócio?, temos que obter a capitalização bolsista da Pararede e a sua dívida líquida.
Para obter estes dados, nada melhor que consultar o site da CMVM (www.cmvm.pt). Se estivéssemos perante um papel cotado nos EUA, procuraríamos pelos SEC Filings.
- Assim, quando entramos no site da CMVM deparamos do lado direito com uma caixa de pesquisa por “Entidades Emitentes/Sociedades Abertas”. Aqui vamos colocar “Pararede”.
- Aparece uma lista onde consta Pararede, escolhemos a dita.
- Aparece um menu com várias opções, entre as quais “prestação de contas”, vamos escolher esse.
- Depois escolhemos “Contas trimestrais” pois neste momento são as mais recentes que existem.
- Escolhemos agora as contas trimestrais mais recentes (3º trimestre de 2005), o que nos dará acesso ao relatório das ditas em formato PDF.
A primeira dificuldade em Portugal, é saber-se quantas acções existem de uma empresa. Raras são as empresas que o dizem de forma clara. Temos que procurar exaustivamente no relatório uma pista ... acabamos por achá-la na página 8 ...:
“com o valor nominal de € 0,10 (dez cêntimos)”
Ora, se o Capital Social (presente tanto nessa página 8 como na página 1) é de 36 371 469,40 €, então existem 1 / 0.1 = 10X isso em acções, ou seja, 363 714 694 acções emitidas.
Sabendo nós o número de acções emitidas, podemos calcular a Capitalização Bolsista, que é a cotação actual de Pararede, vezes o número de acções, ou seja 363 714 694 x 0.29 = 105.5 milhões de Euros.
Vamos agora procurar a Dívida Líquida, que deveremos achar no Balanço da Pararede (ver artigo sobre balanço Aqui), presente no mesmo relatório trimestral ...
Temos no balanço “Caixa e equivalentes” de 0.698 milhões de euros, e “Empréstimos” de 10.045 milhões de euros. Portanto, a Dívida Líquida é de 9.347 milhões de euros.
Assim, de forma simplificada o Enterprise Value (EV) seria a Capitalização Bolsista + Dívida Líquida, ou seja, 105.5 milhões + 9.347 milhões =114.847 milhões de euros.
Determinar o EBITDA
Falta-nos somente saber o EBITDA para obter o EV/EBITDA.
O EBITDA obtém-se da Demonstração de resultados (útil ver o artigo sobre a Demonstração de Resultados, Aqui), e essencialmente é a soma do Resultado Operacional com as Amortizações. Ainda assim, a maior parte das empresas anuncia directamente o EBITDA, ou no mínimo a margem EBITDA (a qual bastaria multiplicar pelas vendas para obter o EBITDA, não esquecendo que queremos valores anuais).
Ora, aqui surge um problema, o EBITDA da Pararede foi negativo nos 9 meses a que respeita este relatório. Isto, só por si deveria fazer-nos pensar. Não é boa ideia comprar empresas com EBITDA negativo a menos que tenhamos alguma óptima razão para pensar que a situação se inverterá no curto prazo. Em todo o caso, mesmo quando temos razões para acreditar nisso, convém que a empresa esteja a um desconto fenomenal. Ora, a Pararede tinha nos 9 meses vendas de 41.231 milhões de euros, que anualizariam linearmente para 41.231 x 4/3 = 54.97 milhões de euros (o 4/3 vem de que um ano tem 4 trimestres, e os números que estamos a anualizar respeitam a 3 trimestres)... numa capitalização bolsista de 105 milhões de euros, isto é um Price/Sales de 2, ou seja, Pararede estando numa má situação transacciona a prémio!!! Para a frente porém utilizaremos 65 milhões como estimativa de vendas da Pararede, para sermos optimistas e porque eles integraram a Whatevernet no primeiro semestre, o que faz com que a anualização acima usada subestime as vendas que eles deverão alcançar.
Bem, mas vamos tentar apurar um EBITDA mesmo assim. A Pararede menciona que sem determinados efeitos, o EBITDA teria sido 1.2 milhões de euros. A Margem EBITDA seria assim 1.2 / 41.231 = 2.91%. Vamos ser incrivelmente optimistas e acreditar que a Pararede conseguirá no futuro uma margem EBITDA de 5%.
5% x vendas anualizadas atrás pressupostas de 65 milhões= aproximadamente 3.25 milhões de EBITDA no ano, para Pararede, sendo optimistas.
Assim, podemos finalmente calcular o EV/EBITDA, que é 114.847 / 3.25 = aproximadamente 35.
Interpretando o EV/EBITDA
Com todos os pressupostos optimistas que tomamos, ainda assim o EV/EBITDA saiu a 35. O EV/EBITDA não é um múltiplo de Free Cash Flow, ou seja, um EV/FCF é maior ainda que um EV/EBITDA. Ora, um EV/FCF de mais de 10 começa a ser “justo” e um EV/FCF de mais de 20, é claramente caro a menos que estejamos a falar de empresas excepcionais de margens elevadas, crescimento elevado e com grandes barreiras à entrada.
Assim, falando de EV/EBITDAs, poderiamos tirar conclusões relativamente semelhantes para EV/EBITDA maiores que 8 e 16. Em todos os casos, 35 é fantasticamente elevado. MESMO que usássemos o antigo objectivo da Pararede de atingir uma Margem EBITDA de 10%, esse múltiplo ainda seria de 17.5. Para uma empresa de margens baixas e indiferenciada, continua a ser elevadíssimo.
Conclusão
A Pararede mesmo a 0.29 está cara. Só faz sentido comprar acções da Pararede numa óptica de especulação, e mesmo aí faz pouco sentido. Não quer dizer que não subam, mas parte-se de uma base elevada e isso introduz risco desnecessário no investimento.
Autor
Incognitus, em 9/12/2005
Comentários
Existe no fórum um tópico destinado a comentar este artigo e complementa-lo.
Disclaimer
Este comentário é um artigo de opinião e nunca uma recomendação de compra ou venda. Alerta-se ainda que a compra ou venda é da responsabilidade do investidor bem como o lucro ou perda daí existente. O Autor pode ter, e provavelmente tem, posições nos títulos referidos neste artigo. Em caso de dúvidas, deverá o investidor procurar um intermediário financeiro, a Euronext, ou a CMVM.