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Autor Tópico: Livros  (Lida 70839 vezes)

vbm

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Re: Livros
« Responder #360 em: 2019-01-31 11:58:11 »


Quase a acabar, cito esta
observação interessante -:):


«Que as cousas acreditas, vejo eu,
     por tas dizer, sem que o como te assome;
     e, se em tanta acreditas, se escondeu.

Fazes como o que a cousa por seu nome
    aprende bem, mas sua quididade,
    se outro lha não mostrar, já se lhe some.»

                           *

«Io veggio che tu credi queste cose
    perch’io le dico, ma non vedi come;
    sic che, se son credute, sono ascose.

Fai come quei che la cose per nome
    apprende ben, ma la sua quiditate
    veder non può se altri non la prome.» 


Dante, Par., Canto XX, vv 88 a 93

vbm

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Re: Livros
« Responder #361 em: 2019-02-12 12:57:49 »
Concluí a (leitura da) tradução do Graça-Moura.
Não gostei. Nenhuma elegância.

Fui 'espreitar' a tradução do Prof. Marques Braga:



Li, reli, cuidadosamente, o Canto XXV d' O Paraíso.

Francamente, Graça-Moura traduziu cuidada e literalmente
o original italiano; Marques Braga, intelectualizou, embelezeu
e iluminou em nossa língua o divino poema de Dante.

É o que me pareceu da clara compreensão de todo o Canto Par., XXV.
Vou tentar a releitura dos últimos nove cantos do poema, do XXV ao XXXIII,
no original e nas duas traduções. (Talvez até, se tiver coragem, toda La Commedia

Quando estive em Turim, há uns anos,
cheguei a comprar a edição
da Fògola Editore in Torino,
1ª edizione Ottobre 1977




Compare-se este terceto  Par., XXXIII, 123

Oh quanto è corto il dire e come fioco
al mio concetto! e questo, a quel ch'i' vidi,
à tanto, che non basta a dicer ''poco''.

                          *

Como é curto o dizer e como é rouco
a meu conceito! e este, a quanto vi,
é tanto que não basta a dizer «pouco».

                         *

Ó quanto é imperfeita a palavra, quanto é ineficaz a
patentear o meu conceito! e este comparado ao que
eu vi, é menos que pouco, é pouquíssimo.



Por mim, não duvido. Bem mais bela, inteligível
e preferível, a tradução do Prof. Marques Braga.

Graça-Moura vale pela erudita literalidade.

Zenith

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Re: Livros
« Responder #362 em: 2019-02-12 13:40:03 »
Citar
Dolce color d'oriental zaffiro,
che s'accoglieva nel sereno aspetto
del mezzo, puro infino al primo giro,
alli occhi miei ricominciò diletto,
tosto ch'io usci' fuor dell'aura morta

Dante e Virgilio saem do subsolo infernal e contemplam o céu recheado de estrelas até ao amanhecer onde o céu começa a adquirir tom de um azul intenso.
Borges considerava a Divina Comédia uma fonte de prazer estético infindável. Foi ele que me levou a ler Dante.

Automek

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Re: Livros
« Responder #363 em: 2019-02-12 13:48:09 »
Bem, nesse exemplo a diferença é abismal vbm !

Não sei se concordo contigo sobre preferir a elegância e inteligibilidade que atribuis ao Marques Braga.
Não deveremos ler uma obra o mais aproximadamente possível do original, mesmo que isso envolva um esforço superior de compreensão ?
É que essa elegância e inteligibilidade parece, pelo exemplo exposto, o resultado de uma certa (grande ?) adulteração do texto original. Não terá ele extravasado, e muito, o papel de tradutor (que tem, obviamente, uma quota parte de adaptador) ?


vbm

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Re: Livros
« Responder #364 em: 2019-02-12 15:26:08 »
Talvez, automek. Longe de mim depreciar Vasco Graça-Moura, aliás da minha terra! -:)), com quem nunca propriamente falei, mas que conhecia, – como  ele me conhecia – de vista! Um dia, incluso, numa reunião de Pais numa creche na Foz, vi-o e ouvi-o, numa pequena reunião a passar uma tal reprimenda à direcção da escola por não cuidar de uma grade de segurança no passeio à porta de entrada e saída da creche, que fiquei abismado com a fluência da sua palavra argumentada! Essa cena foi antes do 25 de Abril. Já depois, dizia-se aliás que ele, o Amaro da Costa e um outro que agora não lembro, eram os três políticos que melhor discursavam e falavam na nossa língua! Ele, em relação a mim, tinha porém, uma enormíssima inferioridade: nadava pior que um velho! de bruços, a cabeça de lado, toda fora d' água, abrindo os braços sem nenhuma naturalidade, evitando a água na boca, como o diabo da cruz, lento, desengonçado, pior que um velho, pior que uma velha. Assim o vi, mais de uma vez, no Tamariz! Quanto a mim, nunca pratiquei qualquer desporto, excepto, justamente a natação, não propriamente competindo, simplesmente nadando, não direi como Johnny Weissmuller, mas parecido, pelo menos! – quer à tona d'água quer submerso -:)
« Última modificação: 2019-02-12 15:28:47 por vbm »

vbm

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Re: Livros
« Responder #365 em: 2019-02-12 15:37:49 »
Jorge Luís Borges é inexcedível!
Li-o na edição do Círculo de Leitores.

Algures, na net, suponho, – ou não… –,
ele conta ter aprendido italiano a ler
A Divina Comédia, em edição bilingue
no trajecto de autocarro que
diariamente percorria
na cidade!

Automek

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Re: Livros
« Responder #366 em: 2019-02-12 15:50:55 »
Dante e Virgilio saem do subsolo infernal e contemplam o céu recheado de estrelas até ao amanhecer onde o céu começa a adquirir tom de um azul intenso.
Borges considerava a Divina Comédia uma fonte de prazer estético infindável. Foi ele que me levou a ler Dante.
Zenith, leste no original ou traduzida ?

vbm

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Re: Livros
« Responder #367 em: 2019-02-12 16:06:35 »
[ ]
parece, pelo exemplo exposto, o resultado de uma certa (grande ?) adulteração do texto original.

[ ]

Não me parece, pelo menos neste exemplo, que o Marques Braga
adultere o que quer que seja do que Dante diz. Pelo contrário,
ilumina viva e intelectualmente o que o autor exprimiu.

Qualquer um de nós tem essa experiência:
da palavra, ao conceito à intuição vivenciada
- é uma clarividência crescente!

A palavra referencia; o conceito dá a inteligibilidade
da coisa; a experiência da coisa funde-a
na própria vivência do espírito.


Mas ressalvo o valor da literalidade,
porque se pensar a palavra oral
e não a escrita,

– como pode ter sido a ideia do autor –,

aceita-se melhor a descrição da palavra ser curta (rápida),
rouca (um som que ecoa, desagradável) em comparação
com o elaborado de um conceito que dá a ver (próprio da palavra
e da linguagem escrita que apela ao entendimento da situação)
mas sem proporcionar a imediatidade de uma compreensão intuitiva!
« Última modificação: 2019-02-12 21:38:36 por vbm »

vbm

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Re: Livros
« Responder #368 em: 2019-02-13 16:57:56 »



«E eis que, ao que parece, se gera um acordo sobre o que devemos
ter por tirania: confirmando o provérbio, o povo, de tanto desejar
fugir do fumo que é o jugo do poder exercido por homens
livres, caiu nas chamas do fogo que é a tirania,
o poder de um todo-poderoso escravo.» 

                          (Platão)

Zenith

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Re: Livros
« Responder #369 em: 2019-02-13 20:31:31 »
Dante e Virgilio saem do subsolo infernal e contemplam o céu recheado de estrelas até ao amanhecer onde o céu começa a adquirir tom de um azul intenso.
Borges considerava a Divina Comédia uma fonte de prazer estético infindável. Foi ele que me levou a ler Dante.
Zenith, leste no original ou traduzida ?

Uma edição biligue franC~es italiano

Automek

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Re: Livros
« Responder #370 em: 2019-02-15 18:34:08 »

vbm

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Re: Livros
« Responder #371 em: 2019-02-21 10:24:03 »
Continuo na releitura pausada, incluindo as notas de pé de página
explicativas da cultura do século 13, do Par., Cantos 25 ao 33,
na tradução do Prof. Marques Braga, no original italiano
e na tradução literal de Vasco Graça-Moura.

Não oferece dúvida: a versão de Graça-Moura
pouco mais é inteligível que o original de Dante,
e seguramente muito menos belo. Marques Braga,
ao contrário, é perfeitamente compreensível,
para um português do século 20.

E está a ser um prazer pousar naqueles tercetos
lógicos, psicológicos, belos e sentidos,
deste modo demorado, imerso
na cultura novilatina,
da antiga Grécia
à nossa Europa
ainda de hoje.

Vejam só as três versões iniciais deste Canto 28:

...................................... //......................................

«Depois que, em repreensão à vida presente dos
míseros mortais, aquela que eleva a minha alma
à contemplação do Paraíso mostrou a verdade;

como quem vê de improviso, no espelho, a chama
   da tocha, que se acende atrás de si, antes
   de a ter visto ou ter pensado nela,

e se volve, para ver se o vidro
   lhe diz a verdade, e encontra o acordo
   como dum canto ao seu ritmo;

assim a minha memória se recorda
   do que eu fiz, olhando os belos olhos,
   dos quais se serve o Amor para prender-me»

Dante
, Par., Canto XXVIII, 1-12

                    *

Poscia che ‘ncontro a la vita presente
   d’i miseri mortali aperse ‘I vero
   quella che ‘mparadisa la mia mente,

come in lo specchio fiamma di doppiero
   vede colui che se n’alluma retro,
   prima che l’abbia in vista o in pensiero

e sé rivolge per veder se ‘l vetro
   li dice il vero, e vede ch’el s’accorda
   con esso come nota con suo metro;

cosí la mia memoria si ricorda
   ch’io feci riguardando ne’belli occhi
   onde  a pigliarmi fece Amor la corda.

                     *

Após abrir contra a vida presente
   dos míseros mortais o verdadeiro
   essa que emparaísa a minha mente,

como no espelho a chama de um tocheiro
   aquele vê que atrás ela alumia
   antes de em vista ou mente a ter primeiro,

e então se volta ao vidro e avalia
   se ele diz a verdade, e se se acorda
   com ela como ao metro a melodia;

assim minha memória se recorda
   de eu o ter feito, o belo olhar olhando
   onde a amarrar-me Amor teceu a corda.

...................................... //......................................


vbm

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Re: Livros
« Responder #372 em: 2019-02-24 07:32:00 »
Continuo no Convívio de Dante.

Que autor extraordinário!
Diria, muito melhor do que "falar com um preto"!

Entendamo-nos, sem nenhuma ponta de fas(ra)cismo:
- já o mostrei e demonstrei, preto é cor, bonito;
negra é a miséria, material ou mental.

O que se passa a conversar, passa-se com Dante:
é um autor despoluído, de tudo o que se passou
no século xiv, xv, xvi, xvii, xviii, xix, xx, xxi.

Um saudável espanto!

Que potência de dizer,
sem um único tique
dos locutores do nosso tempo,
sem sombra da infantilizada
e efeminada comunicação social;
uma benfazeja despoluição mental.

-:)
« Última modificação: 2019-02-24 07:32:41 por vbm »

vbm

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Re: Livros
« Responder #373 em: 2019-04-29 17:22:52 »
Reitero, imprescindível
ler Daniel Dennett, From
Bacteria to Bach and Back
,
da Penguin Books.

E meditar, p. 59 da
Courrier internacional
de maio 2019, onde diz:

«Se investirmos ( ) pouco
no desenvolvimento da
consciência ( ), a sofisticada
Inteligência Artificial dos
computadores só servirá
para dar mais poder à
estupidez natural dos
seres humanos.»
« Última modificação: 2019-04-29 19:05:02 por vbm »

vbm

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Re: Livros
« Responder #374 em: 2019-05-01 20:16:51 »


Eric Roll (1907-2005), História das Doutrinas Económicas
(«A History of Economic Thought», 1938),
trad. Cid Silveira de 3ª ed. 1954, Companhia
Editora Nacional, São Paulo, 1062

Este também saiu do baú
ao cabo de meio-século!

Vale a pena ler os últimos
cinco capítulos já sobre a
economia moderna.(*)

Há uma observação impressiva
sobre a «melhoria dos métodos de ensino
e dos manuais». A antiga divisão entre a economia
"pura" e a "descritiva", a determinação de preços
em concorrência perfeita ou na realidade
das condições monopolistas e do
ciclo de negócios esbate-se
ao comparar manuais
de há oitenta anos
aos do pós-2ª GM,
já baseados

em agregados e flutuações macroeconómicas,
e onde tudo quanto os estudantes do princípio
do século XX haviam «penosamente relacionado
e combinado em seu próprio espírito durante
os seus vários cursos» é-lhes agora
apresentado sinopticamente
logo no seu 1º ano do curso! (pp. 517-18)

-:)

------- // -------
(*) Mas hei-de ler os outros!
« Última modificação: 2019-05-18 09:35:04 por vbm »

vbm

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Re: Livros
« Responder #375 em: 2019-05-21 20:35:38 »
Há anos que desejava ler a Divina Comédia
e não ousava sem preliminares!

Não foi caso único. Vários autores
são impenetráveis, sem gazua
que os abra.

Sucedeu-me com vários.
Deleuze, Espinosa, Leibniz,
Descartes - Wittgenstein
foi mais rápido! -:) - e
outros.

Dante, foi o caso.

Mas finalmente, li-o e reli-o.
Sem dúvida, habita-se nele.

O Prof. Marques Braga é a tradução recomendável.

Pela semelhança das duas línguas novi-latinas
vale a pena confrontar o texto original.

Mas as notas do tradutor na edição da Sá da Costa,
são um bordão precioso. Os três Cantos,

Inferno
Purgatório
Paraíso


compõem o roteiro universal
da profundidade à eternidade.

E o último verso de cada um dos três Cantos
é a mística unidade da Eterna Luz:

                   *

e daqui, ( ), saímos para tornar a ver as estrelas
(«E quindi uscimmo a riveder le stelle»)
                 
Inf., XXXIV, 139   

e já puro ( ) e disposto a subir às estrelas
(«Puro e disposto a salire a le stelle»)

                Purg., XXXIII, 145

pelo Amor, que move o Sol e as outras estrelas
(«L’amor che move il sole e l’altre stelle»)

                Par., XXXIII, 145
« Última modificação: 2019-05-21 20:36:35 por vbm »

vbm

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Re: Livros
« Responder #376 em: 2019-05-29 09:56:11 »
Na História das Doutrinas Económicas de Eric Roll,
muito interessante, surpreendente, como tudo está
in ovo em Sir William Petty (1623-1687),
pp. 85-99, o primeiro a estruturar em
mente lógica, a teoria do valor
e dos salários, assim como
a teoria do lucro ou
excedente,
que na realidade
é uma teoria de renda.

Muito bom.

Vale a pena ler a História
do fim para o princípio -:)

vbm

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Re: Livros
« Responder #377 em: 2019-06-06 19:16:56 »
Sempre achei este quadro
mais iluminante do que parece:



vifer

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Re: Livros
« Responder #378 em: 2019-06-06 19:45:09 »

Inferno
Purgatório
Paraíso[/i]

compõem o roteiro universal
da profundidade à eternidade.


Nao tem nada a ver com o tema do VBM mas o purgatorio é uma das "invençoes" mais bem sucedidas dos pensadores até á data. Coisa "divina" mesmo.. :o

Citar
Os que morrem na graça e na amizade de Deus, mas não estão completamente purificados,
passam após a sua morte por uma purificação, afim de obter a santidade necessária para entrar na alegria do Céu.
O purgatório e a purificação final dos eleitos que necessita de piedade Divina, distinta do castigo do inferno.
A tradição da Igreja fala de fogo purificador.
A Igreja recomenda também as esmolas, as indulgências e obras de penitências em favor dos finados
;D

vbm

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Re: Livros
« Responder #379 em: 2019-06-06 21:29:52 »
Pois... mas a Divina Comédia
deve ler-se com olhos do saber actual.

Toda a figuração da política e da justiça,
é perceptível na inteligência do nosso século.

Por exemplo, correspondo ao inferno, purgatório,
paraíso, o roteiro dos três géneros de conhecimento:
o dos sentidos de quanto ocorre; o do entendimento
explicativo das coisas segundo o que as causa;
o estádio último de tudo inteligir derivando
as leis causais de um supremo princípio
que as unifique e fundamente.
(É um êxtase!)

O resto não interessa. Temos de entender
o sentido das coisas; optar pelo que é justo.

Há tercetos espantosos na Commedia de Dante!
Vale a pena mergulhar nela -:)