Sistema de trading SESUR9M

Da Thinkfn

Por João Dinis de Sousa Finbolsa.com (http://www.finbolsa.com) Escrito em 21 de Setembro de 2009

Com este artigo pretendo apresentar um sistema de investimento baseado em Dados Fundamentais que tem dado bons resultados nos últimos anos (desde 2003 até 2008). Podemos dizer que se baseia em Dados Fundamentais, embora não nos métodos clássicos de Análise Fundamental (cálculo dos Discounted Cash-Flows, etc). O acrónimo do sistema é SESUR9M, que significa: Sistema baseado na Selecção de Expansão SUstentada e Rentabilidade, por Análise dos Resultados dos Primeiros 9 Meses. As características do sistema são as seguintes.

Características gerais

Enfoque em acções. A alocação do capital é exclusivamente em acções. Não quer dizer que se não deva complementar com outros activos para equilibrar o risco. Mas o sistema refere-se à parte que é alocada a acções. Classicamente, as acções tendem a bater todos os outros investimentos a longo prazo.

Buy and Hold permanente. Está-se sempre investido longo, permanentemente, sem um único dia de excepção, e com 100% do capital destinado a acções investido segundo o sistema. A lógica é desistir conscientemente de tentar determinar momentos de entrada ou saída, de estar fora, etc, por não haver qualquer evidência de que essas tentativas confiram algum retorno a 95% dos investidores.

Rotação de carteira anual. A carteira é rodada uma vez por ano, de acordo com nova análise feita, com os novos dados, e é detida por um ano e um dia. Depois de garantir a venda das acções que se tinha, não se deve esperar mais do que algumas horas para comprar as novas. Tudo no mesmo dia. De preferência acções líquidas, para facilitar a sua transacção rápida, sem enfrentar spreads altos. Dar ordens ao melhor no fim do dia, se necessário for, para garantir que tudo fica feito rápido. A rotação anual tem a vantagem adicional de escapar ao imposto sobre mais valias. De preferência entre 5 e 8 acções distintas (com menos de 5, o risco é grande; com muito mais de 8, torna-se difícil a carteira suplantar significativamente o índice de referência).

Momento da rotação. Os primeiros dias de Dezembro são um momento ideal porque, não só já se sabem os resultados anuais do ano transacto, mas também os dos primeiros 9 meses do ano corrente. Estes últimos permitem extrapolações para o total do ano. Antecipa-se assim, qualquer rally do início do próximo ano que premeie as empresas que tiveram melhores resultados.

Objectivo e sua lógica. O objectivo não é ter retorno positivo em todos os anos, mas sim bater o mercado (o índice principal do mercado). Por exemplo, se o mercado ganhar 20% e a carteira ganhar 28%, ou se o mercado cair 15%, e a carteira perder apenas 10%, considera-se que esse ano foi positivo. Ao fim de vários anos, como os índices de acções batem todos os outros investimentos, se este sistema bater o índice por 5-10% ao ano, o incremento de património será grande. De notar que Warren Buffett fez uma fortuna colossal também com um sistema fundamental de Buy and Hold, e com ganhos anuais supranormais apenas moderadamente acima destes. Se nós ganharmos 10,000 vezes menos do que ele, já será bem bom. De notar ainda que a carteira recebe os dividendos, que às vezes não entram nos cálculos oficiais do índice principal (por exemplo, o PSI 20 não os inclui; por isso, se compararmos a performance de qualquer carteira Buy and Hold com este índice, o resultado diferencial desta é na realidade maior do que o calculado, por ela receber os dividendos).

Mercados. Deve-se escolher mercados pequenos, pouco eficientes, nos quais haja menos analistas fundamentais a competir, por forma que as últimas informações não se reflictam rápido nas cotações. Exemplos: Portugal, Espanha, Bélgica, Holanda. O sistema foi por mim testado em Portugal, com bons resultados no período 2003-08. Além disso, vai ser necessário analisar com algum detalhe as contas da maioria das empresas líquidas de um mercado, pelo que é bom que o universo delas não ultrapasse as 50-100. Não somos o Buffett, não temos batalhões de analistas a trabalhar para nós.

Selecção de acções

A selecção de acções é vital, pois é a única forma de obter resultados supranormais, já que se desiste de tentar determinar quaisquer timings. Começa-se com todas as acções cotadas no Mercado Contínuo, e faz-se vagas de rejeições sucessivas, a seguir descritas, até apurar as que vale a pena deter em carteira.

Primeira vaga: liquidez e rentabilidade da empresa. Rejeita-se imediatamente acções que negoceiam raramente (ex: Orey), pois estas têm problemas nos spreads de negociação. Mas as que tiverem frequência de transacção acima de 90% aceitam-se, e terão a mesma atenção e peso na carteira do que as mais líquidas (ex: Novabase e Ibersol contam tanto como EDP e PT). Rejeita-se qualquer empresa que tenha dado prejuízo no ano transacto, ou nos primeiros 9 meses do ano corrente. Assim, rejeitam-se as turn around situations (perigosas). Rejeita-se ainda empresas já alvo de OPA e prestes a sair da Bolsa. Esta primeira vaga tende a reduzir a metade as 48 empresas cotadas no Contínuo em Portugal. Claro que, se aplicada ao BEL20 ou ao AEX25, será diferente. Mas, nesses mercados, convirá começar com um universo mais vasto do que só 20-25.

Segunda vaga: rejeições especiais. Esta vaga é subjectiva, e destina-se a rejeitar empresas de que não gostamos por conhecermos certos aspectos fundamentais ou qualitativos. No meu caso, rejeitei em muitos anos BCP, por me parecer pior gerido do que os outros bancos.

Terceira vaga: dados fundamentais. Dever-se-á obter, para as (talvez entre 18 e 25) empresas que tiverem ficado, os relatórios dos primeiros 9 meses do ano, e uma masterlist baseada nos dados anuais do ano transacto (o programa Finbolsa faz masterlists destas; veja exemplos em http://www.finbolsa.com) com os seguintes rácios: PER corrigido (de resultados extraordinários); P.Cash-Flow ratio (PCF); Dividend yield; EV/EBITDA; Incremento das Vendas anual no ano transacto (ou seja, entre 2007 e 2008, se estivermos a fazer a análise em Dezembro de 2009) (chamemos a este item IVEN1); Incremento de Vendas nos primeiros 9 meses do corrente (ou seja entre os primeiros 9 meses de 2008 e os de 2009) (IVEN2).

Dever-se-á imediatamente rejeitar empresas que não tenham ambos os IVEN1 e IVEN2 positivos. O ideal é ambos positivos e acima de 10%. Notar que o IVEN2, embora diga respeito aos 9 meses, quase de certeza permite extrapolar para o ano todo, já que é improvável que o 4º trimestre altere fortemente a tendência. Convém ambos os IVEN positivos e “sustentados”. Ou seja, se forem 1% e 60% é mau, pois a grande subida recente pode já ter causado um boom nas cotações; se forem 10% e 12% é óptimo; se forem 7% e 6% é aceitável; se forem 2% e 3% é pior, são crescimentos baixos; neste último caso só deve aceitar-se a empresa, se não houver melhores alternativas no IVEN1 e IVEN2. O sistema aposta assim em Expansão Sustentada do negócio das empresa, o que está expresso no seu acrónimo (SESUR9M).

Dever-se-á de seguida passar aos próprios relatórios dos 9 meses (que, para as empresas portuguesas, se podem descarregar do site da CMVM, http://www.cmvm.pt, e para as espanholas se podem descarregar do site http://www.bolsamadrid.es), calcular o Enterprise Value (EV) e o EBITDA. O EV é a soma da capitalização bolsista, da Dívida Remunerada, e dos Interesses Minoritários avaliados a preços de mercado (esta última parcela poderá ser omitida em muitos casos, ou calculada só aproximadamente). Dever-se-á escolher os mais baixos rácios EV/EBITDA. Valores entre 7 e 11 para as blue-chips são aceitáveis, próximos dos 6-7 são óptimos. Para as small-caps, valores nos 4-6 são bons. Na ausência de EV/EBITDA, deve olhar-se para o PCF. Este deverá ser baixo. Por exemplo, se virmos um PCF ou um EV/EBITDA na casa dos 2.5-3.5 numa empresa small-cap, e obedecendo a todos os critérios acima, devemos lançar-nos de cabeça. Na minha experiência, isto costuma dar ganhos de 100-200% nos 1-2 anos seguintes (nos últimos anos, a Efacec, Cofina, e Mota-Engil estiveram nessa situação e deram retornos dessa ordem).

O PER corrigido pode ficar para o fim. Será bom se estiver entre 8 e 15, mas isto não é dogma. Mesmo que seja 30 ou 40, não se deverá hesitar em comprar, se os critérios anteriores dos dois IVEN positivos, e do EV/EBITDA e PCF baixos se verificarem. Convém que a empresa pague dividendos, e que o Gross Div.Yield seja acima dos 4%, mas se for só 3% e os outros critérios estiverem fortes, aceita-se.

De notar que este sistema rejeita as growth stocks, ao exigir EV/EBITDA e/ou PCF baixos (que significam rentabilidade alta já no presente, e não prometida vagamente para o dia de são nunca). Ele também rejeita as empresas que estão a começar a entrar em crise, ao exigir ambos os IVEN positivos, e lucros nos dois anos. Rejeita os arriscados turn arounds. Rejeita ainda as empresas que cresceram muito, mas só no ano corrente, logo aposta nalguma sustentabilidade.

Dever-se-á olhar para os relatórios dos 9 meses com atenção e tentar determinar se os IVEN são realmente baseados em dados comparáveis. Por exemplo, uma empresa pode ter as vendas em queda, mas na realidade apresentar maior volume de vendas porque fez uma aquisição; ou pode ter as vendas a subir saudavelmente e um dos IVEN estar negativo apenas porque a empresa vendeu uma participada, ou mudou os métodos de consolidação. Dever-se-á filtrar estas situações o mais possível e ficar com IVEN que sejam bem significantes de incremento de vendas. Isto é muito importante, pois situações destas, de difícil comparabilidade, aparecem em imensas empresas.

Dever-se-á ter muita atenção ao número de acções emitidas. Este deverá estar actualizado de forma a reflectir todos os splits e aumentos de capital, caso contrário, os rácios fundamentais ficam mal calculados e enganadores. Esta informação não estará no relatório se o split/aumento tiver sido há pouco tempo.

Quarta vaga: curva técnica. Dever-se-á então rejeitar a empresa se, mesmo depois de passar todos os critérios anteriores, mostrar fraqueza nas cotações, num gráfico de 6 meses. Razões para rejeitar são: se estiver geralmente a descer nos 6 meses; se tiver subido, mas começado a corrigir substancialmente (>15%) nas últimas duas semanas; se, mesmo subindo nos 6 meses, tiver tido oscilações que a fizeram ir muito abaixo ou muito acima, tocando os bordos do rectângulo do gráfico; se, já tiver feito um máximo, mesmo que a meio do gráfico, do qual tenha descido muito (digamos, mais de 1/3 da diferença entre o máximo e mínimo dos 6 meses; e se estiver muito recentemente a subir em flecha. Ou seja, dever-se-á escolher curvas geralmente a subir, moderadamente, com o máximo bem à direita, e o valor actual não muito abaixo dele; ou com estabilização num patamar horizontal; ou quase constantes e a subir ligeiramente no fim; ou a subir gradualmente por patamares; com algumas correcções, desde que não muito amplas. Poder-se-á operacionalizar este critério utilizando métodos formais de Análise Técnica (AT), mas nenhum dele deverá ser utilizado à risca. A característica geral e desejável é a de uma cotação em subida consistente e moderada nos últimos meses; o padrão técnico pode ter diferentes aspectos aceitáveis.

Conclusão

Depois de determinar as acções escolhidas, dever-se-á alocar a cada uma um capital aproximadamente igual. Não se deve colocar mais peso nas mais líquidas, pois isso diluiria o impacto dos critérios aqui utilizados. Se alguma das acções já estiver na carteira que finda, deverá manter-se (fazendo as compras ou vendas necessárias, para que se mantenha com o mesmo peso das outras acções escolhidas para a nova carteira). Os ganhos ou perdas que cada acção esteja a ter não deverão ser tidos em consideração, ou seja, não se deverá hesitar em manter por um segundo ano uma acção que já esteja a ganhar 100% ou 200% no primeiro, e que esteja a obedecer aos critérios. De notar que isto é um modo de operar perfeitamente natural, uma vez que os ganhos que qualquer valor cotado em Bolsa acumula num ano têm importância zero para prever o seu comportamento futuro.

O SESUR9M é um sistema relativamente seguro em relação ao comportamento do índice principal, pois aposta em empresas sólidas, já rentáveis e bem preçadas no presente. Ele rejeita situações difíceis, turn arounds, e growth stocks. Ele aposta em empresas com IVEN1 e IVEN2 positivos, ou seja, vendas crescentes e sustentadas, e ainda utiliza critérios de avaliação (EV/EBITDA, PCF, Div.Yield), para seleccionar empresas baratas em termos fundamentais. O programa e bases de dados Finbolsa (http://www.finbolsa.com) permite o acesso fácil a todos estes dados, e os relatórios dos primeiros 9 meses das empresas, que fornecem informação adicional importante, podem ser obtidos do site da CMVM (http://www.cmvm.pt). O sistema tem ainda a particularidade de antecipar em grande medida as previsões de muitos analistas, pois o sistema age no mercado no início de Dezembro, utilizando os resultados dos 9 meses, e fazendo extrapolações próximas da realidade para o ano todo. As notícias sobre resultados anuais começam em fins de Janeiro. Em vários anos de experiência, a carteira comprada começou a bater o índice logo após a compra, e mais acentuadamente em Janeiro-Março, por vezes atingindo diferenciais de 10% ou mais.

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