Venda a descoberto

Da Thinkfn
(Redireccionado de Posição curta)

Uma Venda a descoberto ou Venda curta, (em inglês Short selling, ou shorting) consiste em tomar um activo de empréstimo e vendê-lo no mercado, na expectativa de recomprá-lo mais tarde a um preço inferior ao da venda e devolvê-lo ao proprietário. A diferença de preço entre as duas transacções, após descontar os custos inerentes, representa o lucro da operação. A venda a descoberto permite, portanto, beneficiar da queda do preço de um instrumento financeiro. Diz-se do investidor que vende a descoberto que está "curto" (short) ou que abriu uma posição curta (short position) no respectivo instrumento financeiro. A transacção de recompra do activo é chamada "cobertura" da posição curta (short cover).

Como exemplo prático<ref name=DSL>Ainda o short na DSL (em português). Fórum Think Finance.</ref>, investidores alertados pelo Think Finance para o fenómeno da bolha de crédito em Fevereiro de 2007, identificaram a empresa Downey Financial Corporation (NYSE:DSL) como estando particularmente exposta a créditos sub-prime nos Estados Unidos. Em Maio e Junho de 2007, fizeram a venda a descoberto de acções da DSL a um preço médio de 70 USD por acção. Dois meses depois ocorreu uma queda generalizada dos mercados motivada por receios em relação aos créditos sub-prime. Nos meses seguintes, os investidores poderiam ter coberto a posição curta, comprando a um preço médio de 55 USD por acção a mesma quantidade de acções anteriormente vendidas. O lucro bruto da operação seria de 15 USD por acção, que resultam da diferença entre os preços de venda e de compra.

Venda a descoberto na Downey Financial Corporation (NYSE:DSL). Posições abertas em Maio e Junho de 2007, poderiam ter sido cobertas dois meses após.<ref name=DSL/>

De forma inversa à operação de compra normal de um activo financeiro, que expõe o investidor a uma perda máxima limitada pelo montante investido e a um ganho potencial ilimitado, a venda a descoberto expõe o investidor a uma perda potencial ilimitada (porque não há limite para o preço de um activo) e a um ganho máximo limitado pelo montante recebido na venda (se a cotação descer para zero).

Mecanismo da venda a descoberto

Na venda a descoberto é primeiro necessário que a corretora empreste ao investidor o activo a ser vendido. A corretora obtém o activo para empréstimo por uma de duas vias. Internamente, do inventário da própria corretora ou de outro investidor que tenha uma posição longa nesse activo. Externamente, pode ser-lhe emprestado por outra corretora, por bancos com custódia de títulos ou por sociedades gestoras de fundos.

Sendo um destes cenários possível, a corretora encarrega-se de efectuar o empréstimo do activo para a venda a descoberto. Aquando da recompra para cobertura da posição curta, tem lugar a operação inversa e o activo é devolvido pela corretora à origem. Ambas as operações de empréstimo e devolução ocorrem de forma automática, quando é dada uma ordem de venda de activos que se não possui em carteira, e quando posteriormente é dada uma ordem de compra desses activos, sem necessidade de intervenção expressa do investidor no sentido de obter o empréstimo.

Buy in

Não existe limite temporal para manter em aberto uma posição curta. No entanto, quando o proprietário original do activo emprestado deseja vendê-lo, o investidor pode ser forçado a cobrir a posição curta. Nesta situação a corretora normalmente procura uma fonte alternativa de empréstimo para o activo. Caso não a consiga, força a cobertura nos termos do acordo de empréstimo para vendas a descoberto. Designa-se esta transacção por cobertura forçada (ver artigo Posições curtas - o Buy in).

A cobertura forçada de posições curtas tende a ocorrer na pior altura para o investidor, tipicamente quando o proprietário original do activo emprestado decide vendê-lo para tomada de mais-valias após fortes valorizações. Também ocorre em acções onde as posições curtas já são bastante relevantes ou se grandes detentores de papel que antes estava disponível para ser emprestado, transmitirem aos seus depositários instruções para que esse papel deixe de estar disponível para esse efeito.

Efeitos da venda a descoberto

A possibilidade de vender a descoberto tem alguns benefícios para o mercado. Por exemplo, aumenta a liquidez dos títulos. Também contribui para reduzir a volatilidade causada por desequilíbrios temporários entre a procura e a oferta.

No entanto, da forma como é feita nos Estados Unidos, a venda a descoberto cria acções (ver artigo Posições curtas - Implicações), tal como a concessão de crédito por parte dos bancos cria moeda. Por exemplo, se uma empresa tiver o seu capital denominado por 1.000.000 de acções, e alguém vender curto 500.000, passam a existir no mercado 1.500.000 acções dessa empresa, para todos os efeitos.

Isto tem implicações a diversos níveis:

  • Nos dividendos. Como obviamente a empresa só paga dividendos sobre as acções por si emitidas, quem abre uma posição curta tem que pagar dividendos sobre essa posição curta, de forma a que todas as pessoas que possuem posições longas no título recebam dividendos.
  • Nos direitos de voto, onde o problema é mais complicado. Existem mais posições longas no título do que acções emitidas, pelo que teoricamente podem existir mais pessoas a querer votar os seus títulos em assembleia geral do que os votos admissíveis. Como é que isto é resolvido? Todos podem votar! Os votos de quem não votar são realocados, e se demasiadas pessoas votarem, os votos são pro-rated.
  • No valor da acção. Se existe procura para 1.500.000 acções e apenas 1.000.000 existem, o preço será um, se existe procura para 1.500.000 acções e se podem produzir 500.000 adicionais, ficando com 1.500.000, o preço será mais baixo. Logo, a possibilidade de criar acções baixa o preço para todos os investidores, estejam eles a emprestar as suas acções ou não.

Custos

A venda a descoberto está sujeita a uma comissão, geralmente semelhante à de compra do mesmo activo. Se o preço de um activo vendido a descoberto subir (a posição evolui de forma desfavorável) um montante correspondente ao da subida é retirado da conta à ordem e movido para a conta margem. Se o preço continuar a subir, quando já não restarem fundos na conta à ordem o investidor terá de recorrer a um empréstimo para manter a conta margem. Ao mesmo tempo, passa a incorrer no pagamento de juros sobre esse empréstimo.

Numa posição curta, aquando da passagem da data ex-dividendo, o dividendo é deduzido da conta do cliente para ser pago ao detentor original dos títulos.

Para clientes a retalho, a menos que o cliente seja muito grande, os brokers não pagam juros sobre fundos resultantes de uma venda a descoberto, nem permitem que estes fundos reduzam o capital emprestado em margem. Isto significa que, se o investidor vender a descoberto 1.000 USD do activo A e com os fundos resultantes comprar 1.000 USD do activo B, perderá os juros que ganharia em 1.000 USD de balanço na conta à ordem e, se o balanço inicial era inferior a 1.000 USD, terá de pagar juros sobre a diferença. Ao montante a receber ou pagar de juros pela manutenção de uma posição curta, chama-se "short rebate".

Fontes de activos para empréstimo

Nos Estados Unidos, para empréstimo de títulos as corretoras recorrem primeiramente aos activos próprios e aos dos seus clientes detentores de posições longas. No caso dos activos de clientes, caso estes tenham sido completamente financiados pelo cliente a corretora necessita da sua permissão para os emprestar, faz um pagamento ao cliente como colateral e paga uma comissão. Se a posição longa foi financiada pela própria corretora, este processo não tem lugar. Certos brokers só permitem vendas a descoberto se outro cliente detiver uma posição longa aquirida desta forma.

Para os seus grandes clientes institucionais, os brokers obtêm títulos para empréstimo externamente. Alguns grandes detentores de títulos frequentemente disponibilizam para empréstimo os títulos que detêm. Estes grandes emprestadores são bancos que fazem a custódia de títulos para terceiros, ou gestores de activos que detêm grandes quantidades de títulos. O empréstimo permite-lhes rentabilizar os títulos a baixo risco, mantendo a flexibilidade de os transaccionar quando necessário. Entre os grandes detentores de títulos para empréstimo contam-se:

  • Deutsche Bank (Frankfurt-am-Main, Alemanha)
  • State Street Corporation (Boston)
  • JP Morgan Chase (Nova Iorque)
  • Citibank (Nova Iorque)
  • Mellon Bank Corp. (Pittsburgo)
  • Bank of New York (Nova Iorque)

A organização internacional para a indústria de empréstimo de títulos é a International Securities Lending Association (ISLA), com base no Reino Unido. Em Junho de 2004 os seus membros detinham títulos num valor total de cerca de 5,9 mil milhões de Euros para empréstimo.

Nos Estados Unidos, os membros da Risk Management Association detinham, em Junho de 2005, títulos num valor total de 5,7 mil milhões de USD para empréstimo.

Short interest

18px Ver artigo principal: Short interest.

Bolsas como a NYSE ou o NASDAQ produzem relatórios acerca do short interest nos diversos títulos, que descriminam o número de acções vendidas a descoberto. Este número pode ser apresentado em percentagem do total de acções admitidas à cotação, ou como o rácio de short interest, que é o número de acções vendidas a descoberto como múltiplo do volume médio diário. Estes relatórios podem ser úteis para detectar tendências nos movimentos dos preços.

Regra do uptick

18px Ver artigo principal: Uptick rule.

Até 6 de Julho de 2007, existia nos Estados Unidos uma regra chamada uptick rule (regra do uptick) que só permitia que uma venda a descoberto ocorresse num uptick. Esta regra não se aplicava a certos instrumentos altamente líquidos.

Naked short selling

18px Ver artigo principal: Naked short sale.

O naked short selling refere-se a vendas a descoberto em que o vendedor não obteve, antecipadamente, um empréstimo de titulos para efectuar a venda. Este tipo de vendas a descoberto é geralmente proibido, e provoca falhas na liquidação (failure to deliver).

Referências

<references/>

Links relevantes