Escândalo nos fundos - O caso Português

Da Thinkfn

O Escândalo nos Fundos, nos EUA

Já há alguns meses que Elliot Spitzer começou nos EUA uma cruzada contra um enorme Escândalo em Fundos de Investimento americanos – o chamado “Late Trading” (também existe furor contra o “Market Timing”, mas aí trata-se de uma prática legal ainda que possa levar à perda de eficiência dos fundos visados).

Este escândalo, que tem tocado a maioria das grandes casas gestoras de fundos norte americanas, em especial a Janus e a Putnam, consistia essencialmente em providenciar a hipótese a bons clientes (geralmente Hedge Funds) de subscreverem os seus fundos às cotações de mercado do dia, após o fecho do mesmo. Obviamente, entre o fecho do mercado e esta acção, muitas vezes surgiram notícias capazes de mover o mercado (resultados de empresas, OPA’s) sendo que era sabido que o mercado no dia seguinte não abriria nos mesmos níveis, providenciando portanto um retorno quase que garantido a quem ainda fosse possibilitado entrar aos preços de fecho do próprio dia.

Isto, obviamente, tem custos, e quem os suporta são os participantes que já estavam dentro do fundo. Porquê? Porque o fundo já não conseguirá obter os preços de hoje para as subscrições que entram após o mercado fechar, vendo-se obrigado a pagar preços superiores no dia seguinte, ao passo que os Hedge Funds obtêm a sua subscrição aos preços de hoje. A diferença, constitui uma perda para os participantes que já se encontravam no fundo (ou melhor, o abdicar de parte do ganho, que realizariam no dia seguinte).

Por exemplo, se o mercado subir 1% na abertura do dia seguinte, e hoje após o fecho forem subscritos 10% do fundo e este estivesse totalmente investido no mercado, no dia seguinte o fundo subirá apenas 0.9%, já que os 10% que acabaram de entrar e ainda não estão aplicados diluirão o ganho de quem já tinha subscrito. A perda de 0.1% em 90% dos participantes, é o ganho de 0.9% nos 10% subscritos pelos Hedge Funds neste exemplo de “Late Trading”.


E em Portugal?

Em Portugal, até inícios de 1998, passou-se exactamente a mesma coisa. Mas cá nunca existiu um Elliot Spitzer, e a prática acabou por ser condenada e extinta pela acção da CMVM sem grandes alaridos públicos.

A prática advinha da possibilidade que os fundos de praticamente todos os Bancos da praça davam de permitirem a subscrição (e por vezes também o resgate) de unidades de participação às cotações conhecidas dessas UP’s, ou seja, a preços derivados das cotações de bolsa do dia anterior.

Ora, se imaginarmos que hoje o mercado está a subir 2% e ainda podemos subscrever vários fundos de acções às cotações de o­ntem, torna-se bastante simples ver a atractividade do negócio. Essa atractividade, porém, resulta da perda a favor dos novos subscritores de ganhos que iriam para os antigos.


E porque se fez tão pouco para obstar a isto sem a intervenção da CMVM?

Bem, o problema aqui reside em que, por um lado os subscritores antigos eram completamente alheios às “perdas de ganhos” que estavam sistematicamente a sofrer. E por outro, os bancos/sociedades gestoras envolvidos ganhavam bastante com a prática, pois:

  1. Obtinham, nesta arbitragem por parte de alguns dos seus clientes, as comissões de subscrição e resgate dos fundos, bem como a comissão de gestão durante um período curto de permanência;
  2. Obtinham ainda em alguns casos, benefícios por facilitarem o financiamento dos montantes usados para a dita subscrição, pois em geral os clientes que detectaram este buraco eram de uma dimensão mais razoável;
  3. E claro, obtinham satisfação para esses mesmos clientes.


Como foi eliminado o buraco?

Eventualmente, perante a pressão da CMVM, e a pressão competitiva de perda de rendibilidade que tal buraco implicava, os Bancos/Sociedades Gestoras decidiram actuar. Numa primeira fase, foram impostas comissões de resgate um pouco mais penalizadoras a curto prazo. Numa segunda fase, passámos ao que hoje se vê, e finalmente foram introduzidas as subscrições e resgates à cotação do próprio dia, ou seja, o subscritor NÃO sabe quanto vai pagar por cada UP ao subscreve-las, pois esse preço só será determinado no final do dia, com base nas cotações da bolsa desse próprio dia.


Conclusão

Nos EUA, o facto do escândalo ter sido tornado público, está a obrigar as Sociedades Gestoras a tentar quantificar e compensar os seus subscritores de fundos pelas perdas sofridas. Em Portugal, apesar de a acção da CMVM ter curado o problema, não foi feita qualquer compensação aos subscritores dos fundos nem se gerou qualquer tipo de escândalo, mas isso não faz com que ele não tenha existido ...


Autor

Incognitus, em 23/8/2004

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